• as questões últimas e a investigação empírica

    Pra explicar uma situação concreta das últimas semanas, tenho que apelar para a metafísica. Não existe o presente. O que existe é uma idéia de futuro e as reminiscências do passado. Daí que o mundo não vem prontinho numa versão só e a gente acaba tendo que escolher o que pensar sobre determinados assuntos. Como não existe o presente e como não sei o que propor pro futuro, tenho voltado ao passado para entender os últimos acontecimentos na USP.

    Meu silêncio parece omissão. Mas não tenho vontade de escrever por aqui sobre o que acontece. Bons relatos pululam na internet. E muitas pessoas me ensinam que ainda não aprenderam a usar o meio virtual. Aqui, reproduzir o que dois ou três jornalistas dizem é um jeito tonto de se apropriar da ferramenta. Só tenho que agradecer pelo mundo não se chamar facebook. Juro: ter cinco aulas com carga de leitura de umas duzentas páginas é muito menos cansativo do que estar presente em plenárias e assembléias. Mas, se não fossem esses espaços e tantos outros que a gente tem buscado nas atividades de greve, a idéia de diálogo, para mim, estaria morta. Viveríamos de cutucar uns aos outros e de curtir com joinhas quando alguém dissesse coisas com as quais concordamos. Preferia que as enquetes não fossem “Você é a favor ou contra a polícia/greve?”. Preferia que as enquetes existissem para saber se as pessoas preferem peixe ou estrogonofe no bandejão. Preferia, em suma, que as pessoas não se caracterizassem como minoria ou como maioria achando que isso qualifica seus discursos. O que qualifica um discurso é o embasamento dele e a possibilidade de colocar esse discurso sobre crítica.

    Um outro problema metafísico com o qual me deparei é ontológico. Eu nunca vivi antes. Posso me basear em relatos históricos, mas sou jovem e a minha experiência tem sido feita agora. Não posso dizer que algo é anacrônico porque não tenho certeza de quais partes do passado foram superadas para estarmos na situação atual. Não posso dizer também que absolutamente tudo foi feito da maneira errada porque não vivi todo o passado e, óbvio!, não vivi o futuro. Não sei aonde essa situação nos leva. Por isso, acho feio ver pessoas adultas chamando os jovens de crianças mimadas. Se alguns de nós se propõem a errar não é por heroísmo, mas porque também vivemos no mundo sem paradigmas. Há os que se acomodaram com a situação ou com a inevitabilidade dela, mas acho que é preciso, mesmo que de forma utópica, lutar contra a naturalização da corrupção, da violência, das relações de poder. Se isso muda o mundo? Não faço idéia.

    Já me fiz tantas perguntas sobre os últimos acontecimentos, tive que reavaliar posições, tive que acatar quando decidiram o que eu não queria. Cheguei a me perguntar se o amor não seria uma forma de transformação do mundo. Ainda me pergunto, na verdade, se um sentimento pode mudar condições materiais. Porque liberdade não há (e, se há, é a idéia de que liberdade é uma calça azul desbotada), igualdade também não (ou, como diz Orwell, “alguns são mais iguais do que os outros”). Da lembrança histórica da Revolução Francesa só nos resta a fraternidade.

    Quando fui resgatar no passado uma experiência parecida, só consegui encontrar 2009, quando a Tropa de Choque da polícia entrou na universidade num momento de greve dos funcionários. No mesmo dia e ao longo daquela semana, manifestações espontâneas moveram estudantes e professores para a frente da reitoria. O que vi ali foram aulas públicas nas tardes frias de junho. Naquela época, houve confronto entre policiais e manifestantes e eu acompanhei o enfrentamento pela internet com o pior da narração espetacularizada. Naquela época, eu sentia vontade de chorar quando via comentários que pediam o sangue (ainda que simbólico) dos manifestantes. Foi naquela época e nas eleições do ano passado que descobri que pela manutenção de alguma sanidade é necessário abrir mão de ler comentários de leitores em grandes jornais. O que aconteceu esse ano foi diferente, percebo em todas as minhas comparações. Mas não, não vou fazer como muitos. Não vou condenar os erros táticos de alguns, porque isso talvez seja condenar dentro de mim minha geração e minha vida ao marasmo. Não vou abrir mão de tentar entender e de tensionar meus pensamentos, embora saiba que as explicações nunca são plenas.

    pra não dizer que não falei das flores

    tropa de choque na universidade

    geography's teacher

    vem vamos embora

    fau's people

    get it


    kafé

    mari's drawing
    (fotos da greve de 2009, tiradas por mim)
    Alguns links interessantes que pulularam por aí sobre o assunto:

    “A USP, os legalismos e o medo”, da minha xará Bárbara C;
    “Você não me quer como aluno da USP”, de Cleber Pelizzon;
    “Nós estamos afundando internamente”, fala de Paulo Arantes em 2010;
    “Desabafo de quem estava lá [Reintegração de posse]”, de Shayene Metri;
    “Esclarendo o caso USP (pra quem vê de fora)”, de Jannerson Xavier e Bárbara Doro Zachi (também xará, ha)
    “A invasão do prédio da USP  do ponto de vista jurídico”, no blog da Folha;
    “Em nome da legalidade: o caso da Independência do Brasil”, do Godinho;
    “Ocupação patética, reação tenebrosa”, de Matheus Pichonelli;
    “La Policía Militar de San Pablo tomó por asalto la Universidad”, no Clarín;
    “Presença da polícia na USP gera polêmica no país”, no “Entre aspas” com Henrique Carneiro e Roberto Romano;
    Jornal na Cultura de 10/11/2011, com Vladimir Safatle e Maristela Basso;
    Áudio de Ricardo Boechat sobre protestos na USP, no Jornal BandNews Rio;
    Like a boss, like a Rodas, só pra rir um pouco.

    Muitos outros assuntos tangenciam o debate, como a legalização da maconha, as greves nas universidades como na Federal de Rondônia atualmente, a corporação Polícia Militar. Espero que um dia todos esses assuntos sejam discutidos de maneira séria e responsável. Espero que as faíscas não sejam apagadas sem gerarem uma qualificação no debate e ações construídas coletivamente.

  • piquenique em toalha de chita

    flower power
     Sou entusiasta de sentar no chão, esticar uma toalha, dividir comida? Sim ou é óbvio?

  • são paulo cenográfica

    Semana passada assisti a Reflexões de um liquidificador. Gostei tanto que passei a semana pensando sobre ele em meio a todos os outros pensamentos que tenho que ter. Esses, já previamente agendados sobre todo o resto, são parte do meu expediente de quem quer mostrar pro semestre acadêmico quem é que manda. (meu medo, claro!, é de que ele acabe comigo antes que eu consiga acabar com ele).

    O que me chamou especial atenção no filme não é o fato do liquidificador se comunicar com a proprietária, ter voz e reflexões complexas. Isso já é a parte esperada, com o próprio título. O que me atraiu é que o filme se passa em São Paulo. Daí fiquei pensando em outros filmes do cinema nacional que têm um foco mais regional, sobretudo no sertão e no Rio de Janeiro. A princípio, não são filmes felizes, com temáticas facilmente digeríveis. Acho que Hollywood e Bollywood conseguem a felicidade plástica mais fácil do que nosso cinema nacional ou mesmo o cinema europeu. Não é difícil imaginar que não me importo que filmes não tenham final feliz ou uma carga dramática (só desejo que esse drama seja suportável e não me leve ao choro convulsionado como Dançando no escuro do Lars von Trier adoraria ter feito).

    Sobre alguns filmes que têm São Paulo como cenário: Reflexões de um liquidificador, É proibido fumar e Durval Discos. Não me lembro de qualquer menção à cidade. Reflexões de um liquidificador explora um pouco mais os cartões-postais, com o narrador (liquidificador) falando sobre a fonte que jorra (no Ibirapuera, é possível identificar) e com a câmera percorrendo a estrutura vermelha que forma o vão livre do Masp. Nos filmes da Anna Mulayert, Durval Discos e É proibido fumar, São Paulo é cenário por suposição nossa, por reconhecermos essa ou aquela rua. Mas, ao contrário do que acontece com Ensaio sobre a cegueira que teve locações aqui, o enredo dos filmes nos leva a crer que a cidade é mais São Paulo do que qualquer outra (em Ensaio a cidade é construída a ponto de não sabermos onde estamos; intencionalmente). Os três filmes têm conflitos, não são histórias felizes. O cenário é uma construção racional mas com uma selvageria potencial. A cidade é barulhenta, as montanhas que por acaso vemos no horizonte estão distantes, inalcançáveis. E os personagens levam uma vida privativa quase absoluta. O desenrolar das histórias se dá em sua maior parte dentro da casa ou do apartamento dos personagens, do Durval, da Baby e da Elvira. Há cenas externas que ou mostram a agitação da cidade, ou ela sendo agitada por algo. Em Reflexões de um liquidificador, a personagem chega a ir para a praia. As cidades do litoral são mencionadas. A capital não é nomeada, sequer é dita como capital. A relação das pessoas acontece nos espaços privados. Aqui, não tem a lavoura, a religião, a comunidade ou a corporação. O que tem são personagens neurastênicos, neuróticos. Por fora, pacatos como o concreto e por dentro psicóticos como a rotina duma grande cidade. Daí que por mais absurda que seja a situação que os filmes trazem, elas me parecem absolutamente verossímeis.

    Me identifico com o caos interno dos personagens pela forma tortuosa que me identifico com o caos externo dessa cidade.

  • três trilhas

    that way
    rumo
    a light that never goes out
    good people
    a feeling with a name
    lago das carpas
    convescote
    the banquet
    dear muffins
    bosque
    existencial emptiness
    birruiva

    Num domingo quente de inverno, em que fomos à Pedra Grande, ver a cidade do alto. Nesse intervalo, conhecemos gente nova, comemos comida boa, (também comemos comida nova e conhecemos gente boa), e andamos pela mata em três trilhas, o que nos deu alguns quilômetros de caminhada e uma fuga de São Paulo dentro dela mesma.

  • toda nudez será castigada

  • vamos pra rua!

    you may say i'm a dreamer

    Sou mais uma das vozes a dizer que a marcha da liberdade foi bonita de ver e de viver. Deixei meus estudos sobre o processo abolicionista no Brasil e fui para a rua gritar por liberdade. Encontrei pessoas queridas, bons amigos, conhecidos simpáticos. Gosto dessas coisas meio catárticas e bastante politizadas. As pessoas se juntando com um espírito bom, não lutando por uma só causa, mas pela possibilidade de se lutar por todas. Os dilemas levantados naquele trajeto, porém, não se resolvem em um dia. Mas é bom para mostrar para o mundo a nossa existência. É bom, principalmente, para mostrar a nossa existência para nós mesmos. Não quero falar muito, acho que minhas opiniões estão bem ditas em tantos outros blogs. Opto pelo discurso das imagens.

  • entre quaresma

    só a bailarina que não tem

    todo carnaval tem seu fim

    atrás do trio elétrico

    felicidade clandestina

    snowy summer

    pra ver o bloco passar

    two girls

    Acima. Carnaval de rua. São Paulo, SP.
    Abaixo. Procissão de Páscoa. Ouro Preto, MG.

    deep in the night

    pra ver a banda passar

    introspection

    serragem

    persona

    courinho

    anjim

    devotion

  • Todos emigram

    moderno e tradicional
    The Unbearable Hardness of Being.

    Cantos Dos Emigrantes
    Cordel Do Fogo Encantado

    Com seus pássaros
    Ou a lembrança dos seus pássaros
    Com seus filhos
    Ou a lembrança dos seus filhos
    Com seu povo
    Ou a lembrança de seu povo
    Todos emigram

    De uma pátria a outra do templo
    De uma praia a outra do Atlântico
    De uma serra a outra das cordilheiras
    Todos emigram

    Para o corpo de Berenice
    Ou o coração Wall Street
    Para o último tempo
    Ou a primeira dose de tóxico
    Para dentro de si
    Ou para todos
    Para dentro de si
    Ou para todos
    Pra sempre todos emigram

    movimento migratório

    perguntaram em algum comentário se as fotos eram minhas. sim, sempre são, exceto quando digo o contrário. 🙂